Os animais se reuniram em assembleia para debater um tópico de extrema importância: é melhor ter emprego ou ser empreendedor? Afinal, como bem explicou o leão no edital de convocação, o assunto era de relevante interesse porque dizia respeito à sobrevivência numa selva cada vez mais competitiva. Par abrilhantar o evento, dois palestrantes externos haviam sido convidados: a galinha e o cachorro. A galinha foi a primeira a se apresentar. Em resumo, ela definiu a vida de empregada como “uma desgraça”. Sua tarefa – produzir ovos – não demandava nenhuma criatividade. Ela passava o dia num cubículo, com centenas de galinhas. Não havia reconhecimento, tanto que nem nome ela tinha. Para evitar que começassem a ter ideias, suas asas haviam sido cortadas. Além disso, ela e suas colegas sofriam constantes assédios sexuais do supervisor. Pior de tudo é que, num belo dia, apesar do esforço demonstrado durante a carreira, ela poderia, sem explicação, ir parar na panela. E isso era in-jus-to!
Aplausos caridosos para a galinha. E aí sobe ao palco o cachorro. Que lamentou a desdita da colega, mas ponderou que neste mundo havia empregos e empregos, e ele não podia reclamar do dele. Para começar, tinha, sim, um nome. E os benefícios diretos eram inúmeros. Assistência média, por exemplo: quando ficava doente, era tratado por um especialista. E alimentação, então? Havia comida balanceada, produzida especialmente para ele. Bastava latir para receber atenção. Seu empregador até o chamava de “meu melhor amigo” (o que fez a plateia emitir um “ooh! de admiração, exceto a girafa, por ser muda). É claro que havia um ou outro inconveniente, como levar um ocasional pé no rabo. Mas ser empregado era ótimo, porque ele se sentia prestigiado e bem recompensado.
Ai, o leão colocou uma questão em discussão: “Vale a pena deixar de lado a nossa selvagem liberdade empreendedora e nos transformar em fiéis subalternos?” Os presentes se puseram a polemizar, até que, finalmente, a coruja pediu a palavra. Disse que a pergunta era inócua, porque aquilo não era uma questão de escolha, mas de natureza: quem nasceu para empreendedor jamais se daria bem como empregado. E vice-versa. “Vejam os humanos”, ponderou a coruja. “Tão inteligentes, mas muitos passam a vida profissional sem conseguir achar o rumo. E sabem por que? Porque eles confundem ideal, necessidade e natureza. Ideal é o que cada um quer ser. Necessidade é o que faz cada um tentar ser o que não é. Mas natureza é o que cada um realmente nasceu para ser. Só vivem felizes e sem traumas os que conseguem juntar o ideal e natureza.”
“Não sei se entendi, mas acho que não concordo”, cacarejou a galinha, que como se sabe, tem cérebro de galinha. E o leão esclareceu: “É simples. Eu não sei qual é a sua natureza nem seu ideal. Mas sei qual é a minha necessidade”. E devorou a galinha.
Moral: quem, em vez de tomar uma decisão, seja qual for, só fica se queixando do sistema, acaba sendo engolido por ele.
Max Geringher
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